Fiquei estarrecido e incomodado com a dupla ignorância sobre o sindicalismo revelada durante as discussões no STF, ignorância sobre os sindicatos no Brasil e sobre os sindicatos em outros países e sua comparação com os nossos.
Um dos principais eixos das argumentações contra as receitas sindicais foi a insistente denúncia do exagerado número de sindicatos no Brasil, consequência, segundo um ministro, do apetite por “verbas do governo” (mas todos sabemos e ele devia saber que a contribuição sindical vem dos trabalhadores e das empresas, apenas recolhida e distribuída pelo agente público, que cobra para isto).
O número de 17 mil sindicatos foi brandido como argumento teórico definitivo e contraposto ao número de sindicatos de outros países, exíguos nas comparações.
O STF, que é o guardião da Constituição, esqueceu que ela permite a existência de um sindicato de uma dada categoria por município (artigo 8º, item II). O regramento constitucional convive, portanto, com a possibilidade da existência de milhares de sindicatos; se limitarmos, por exemplo, a três sindicatos por município (o que seria bastante razoável) e como estes são 5.570, chegaríamos aos 17 mil sindicatos sem que se configurasse anomalia ou exagero.
Exceto fenômenos patológicos e marginais a malha sindical brasileira, além de “caber” na Constituição, é funcional e atende às necessidades de representação dos trabalhadores e dos empresários em um país economicamente complexo e continental. E mais, a dimensão da malha em nada alteraria o montante a ser arrecadado dos trabalhadores e das empresas.
Quanto às comparações internacionais elas foram feitas de maneira irresponsável com o falseamento dos fatos e das instituições e procedimentos.
Como falar de menos que uma centena de sindicatos no Japão e nos Estados Unidos quando, nestes países, a maior parte dos sindicatos tem sua representação por empresa? São, na verdade, milhares e nos Estados Unidos se fazem conhecer pelo termo “local” seguido de um número em cada ramo.
Para estes e outros países mencionados nas discussões os agentes das negociações foram contados como entidades sindicais únicas, desconhecendo-se que existe o contrato coletivo setorial, regional ou nacional. Comparou-se uma jabuticaba a um cacho de uvas ou a uma parreira.
O grande contrato coletivo nacional brasileiro do salário mínimo é negociado com o governo por seis centrais sindicais que seriam chamadas de “sindicatos” na terminologia do STF.
Sem conhecerem a realidade constitucional e institucional do sindicalismo brasileiro e falsearem as comparações internacionais os ministros do Supremo deram uma demonstração clamorosa de preconceitos e leviandades, uma verdadeira conversa de botequim.
Por João Guilherme Vargas Netto, consultor sindical
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