Um dos pontos mais polêmicos da Lei nº 12.965/2014, Lei do Marco Civil da Internet, é o que trata da neutralidade da rede. A lei garante tratamento isonômico a quaisquer pacotes de dados, “sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação”. E seu Art. 9º, parágrafo primeiro, determina que a Anatel e o Comitê Gestor da Internet sejam ouvidos acerca de situações excepcionais nas quais pode ocorrer discriminação ou degradação do tráfego. O que faz a Anatel? Elabora um conjunto de perguntas à sociedade civil abordando basicamente cinco temas (prestação adequada de serviços e aplicações, relações entre os agentes envolvidos, modelos de negócios, comunicações de emergência, bloqueio de conteúdo a pedido do usuário). E intitula esse conjunto de perguntas, de consulta pública.
O Instituto Telecom e o Clube de Engenharia sempre defenderam que a Anatel deveria realizar uma consulta pública explicitando a sua posição sobre as situações excepcionais. Uma consulta de acordo com o que prevê o Artigo 42 da Lei Geral de Telecomunicações: “as minutas de atos normativos serão submetidos à consulta pública por publicação no Diário Oficial da União, devendo as críticas e sugestões merecer exame e permanecer à disposição do público”.
Ora, o conjunto de perguntas elaborado pela Agência pode até ser chamado de pré-consulta, jamais de consulta pública propriamente dita. Afinal, qual a posição da agência sobre que “requisitos técnicos poderiam ser elencados para garantir a qualidade e prestação adequada dos diversos serviços e aplicações cursados sobre o ecossistema da Internet, consideradas as especificidades de cada serviço e aplicação?”. Ou “quais os benefícios para uma regulação prévia e exaustiva (ex-ante) de modelos de negócio possíveis à luz da neutralidade de rede ou, alternativamente, quais os benefícios de uma regulação baseada em critérios gerais, com a avaliação de casos específicos a posteriori (ex-post)?”. São perguntas que ela transfere à sociedade, a pretexto de consulta pública.
Todos nós sabemos o peso que as operadoras têm sobre a Anatel. O que nos preocupa é que, na sua versão final, o texto termine por ficar muito mais pró-operadoras do que respeitar a essência da Lei, de garantir a neutralidade da rede sem colocar o controle dessa chave nas mãos de alguns setores do mercado.
Muitas tecnologias, como o rádio, a televisão e a telefonia, surgiram livres de controle, mas terminaram territórios de grupos poderosos. Não podemos deixar que na regulamentação do Marco Civil da Internet a Anatel favoreça qualquer agente do mercado. Por isso cobramos uma consulta pública que demonstre clara e transparentemente qual a visão da Anatel acerca dos cinco temas sobre os quais ela formulou as perguntas.
Deixe uma resposta
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.